quinta-feira, 26 de agosto de 2010

domingo na praia
.
respiração
silêncio
pausa
flutua
o sol
quente
no céu
flutua
a espuma
na água
salgada
flutua
no sal
sal no nariz
sal na língua
sal na pele fina
sal nos olhos
sal nos poros
flutua
na praia
no oceano
zona de contato com o continente africano
flutua
zona de contato com as baleias jubarte
flutua
e agradece pelo sal
flutua
por todas a águas do mundo.
Dizem que lá no alto daquela torre vive uma moça que ficou careca de saber.
uma pessoa complexada não é alguém tomado por complexos psicológico, complexos estão além das lógicas (e dos lógicos). uma pessoa complexada vive de complexidades, tal qual a sonoridade dessa palavra: complexo. ser complexo é um ser desarticulado, que fica brincando de fazer teia de aranha com os pensamentos. seus e dos outros, é claro. 

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

- olhe, eu não tô aqui pra brincar de rock.

- acenda um cigarro, relaxe.

-putaquetepariu, você não entende? a vida está acontecendo, eu não vou ficar aqui brincando de rock.

-só um cigarro…

-vá se fuder, o mundo tá acontecendo, que caralho que você não entende isso, não dá pra ficar aqui parada, roquezinho pra lá, zuadinha pra cá… 

-se você fumar um cigarro vai se acalmar.

-eu estou calma, como um barco flutuando no mar! por falar em mar, você deveria tentar também, flutuar um pouco, segurar sua pedra e se jogar no mundo…

-meu cigarro acabou, vou ali comprar mais. quer alguma coisa?

-quero sumir porra, quero o mundo!

ele saiu pra comprar cigarros
e ela dormiu.
cada momento faz sentido
no instante vivo de acontecer
mas se juntar tudo num só momento
perde todo o movimento:
dona maria que era bonita porque tinha um sorriso engraçado
fica numa gaveta de registros esquecida, 
em meio a tantos documentos guardados...

teve que acordar,
teve que comer,
teve que se vestir
de alguém que tem um nome.
lhe faltou ânimo,
pra dar risadas do dia-a-dia.
lhe sobrou poesia.
a saudade te acordou,
te deu de comer
em colheradas lentas,
limpando com um lenço velho os cantos de sua boca.
te vestiu com aquele vestido que ele gostava.
se zangou e tirou o vestido:
qual é saudade, tenho que dar risadas do meu dia
deixe o passado, deixe o vestido,
deixe quieta a poesia.

acabo de perceber
como quem percebe que tem orelhas,
de perceber o tanto de interrogação...
sr. palhaço
sr. biruta
sr. gargalhada
sr. careca
sr. barriga
sr. olhe a luz na sua cara
sr. tome vergonha
sr., por favor
faça alguma coisa.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

meia noite
                   meia lua
                                    meio doida
                                                         meio dura
                                                                                          meio sem fins
                meio sem mim
    meio sem meios
                                                         meia fatia
                                                      meio espelho
meio aqui
                  meio ali
    meio indecisa
                                                          meio perdida
                                                                                           meio ilha
                                          meio sozinha
           fim de tudo
                                                                                                                      começo do fim
começo de novo
                             comece sem mim
                                                                   começo sem elos
                             começo sem chão
  fim do começo
  caminho pro não
                                   meio queijo
                                    meio beijo
                             com a faca na mão
                                                                         meio gole
                                                                        meio golpe

muito sangue
                         inundação
palavra começo
                             palavra meio
                                                                           ponto final
                                                     palavra fim.
(até que se vire a página)
como se desliga do modo racional, do tipo que afeta as experiências doces da vida?
as vezes não,
as vozes não.
só que
as vezes sim.

(sobre ter visto o filme 'a origem')
o que diz a palma da sua mão?
diz que linha?
ou diz que não?

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

… para penetrar a camada mais profunda da terra, ali onde os lábios - lábios matéria, lábios carne, lábios barro... lá onde os lábios viram-se em sorrisos, onde a palavra acontece, e fala. lá onde a palavra comunica.
com um olho aberto e outro fechado
olhos cheios de madrugada
pupilas dilatadas
e luneta acesa.
luz de farol girando,
o barco procura ela
ou ela procura o barco?

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

com doses diárias de poesia,
amor de gato, água e comida
vivo esse cotidiano,
que ora me engole, quando não me cospe.
se me lambe, me afaga, me alisa os pêlos do corpo.
talvez me arranhe a cara
e eu chegue em casa depois de uma noite de briga por qualquer pedaço de sardinha
ou por uma fêmea no cio. 
vivo de palavras, meu ser é um tanto racional,
mas sei sentir
as vezes até passo bem.
amor de gato, água e comida,
com doses diárias de poesia,
minha mente, processador de confusão.
eu tonta de tanta nóia 
e meu gato,
gordo e manso, rolando no chão.
será que a poesia me salva?
ou não seria ela uma corda no pescoço?

segunda-feira, 9 de agosto de 2010


era uma vez um tempo que durava menos que um pensamento
era feito uma roda gigante, um grão de areia, uma semente que sempre volta pro chão
era uma vez um tempo que era terra, que era planta, que era fruto, que era terra mais uma vez
era uma vez sempre era uma vez, nunca eram duas ou três
era uma vez uma vez que não passa, que parece sempre a mesma vez (e você sempre aparece)
era uma vez uma vontade de sair dessa vez, de pular da roda gigante
era uma vez uma menina que pulou de uma roda gigante, quebrou três dentes mas correu feliz
era outra vez a mesma roda gigante, a menina banguela girando girando
era uma vez o girar da roda, ora em cima, ora em baixo
era uma vez um algodão doce que desfaz ao toque da saliva
era uma vez o corante rosa na língua da menina, marcando aquele momento rosa de algodão doce 
que embora parecesse nuvem não era azul nem voava no céu 
era uma vez um parque, era uma vez uma semente, era uma vez uma menina, era uma vez uma roda gigante
uma vez era sempre a mesma vez 
ou a vez se desfez e ninguém percebeu?
era uma vez o momento de escrever o momento de dizer , ou melhor, o momento de retirar
retirar cuidadosamente com uma pinça aquele fragmento de coisa, um resíduo no estômago
era uma vez uma palavra retirada
pausa
uma palavra retirada contém sentimento?
não
palavra prolifera
mas o sentimento ainda tá na menina.