sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

sentir viver               sem ti     
sentir viver   sem  te       ver   
sem    (sen)ti ver          
                                                          viver sem te 
viver sem                 te viver
sem te                    ver viver 
sentir te ver           sem mim 
sentir sem ver            sem ti     sem .se.
sentir viver sem ti sentir viver sem ti sentir viver sem ti
, exercício de vida









domingo, 26 de dezembro de 2010

reveillon
deitado na praia, numa dessas praias de verão, que enchem e esvaziam de turistas, garrafas, cigarros, vinhos baratos...
deitado olhando os fogos no céu que estouravam em todo o brasil, em toda a linha do fuso horário
já havia bebido tanto, já havia amado dois naquela ultima noite do ano.
adormeceu sem querer,
sonhou com um ano novo
sonhou com um ano velho
sonhou com uma festa, com corpos dançando axé, sentido a bebedeira de batida de maracujá no seu corpo tonto
sonhou com o tempo brusco, o solavanco do amigo que foi morar em outra dimensão
esteve no metrô da maior cidade da América Latina
  esteve atrasado, esteve lendo embaixo da terra, se sentiu uma formiga na multidão
dançou rock, dançou macumba, não negou uma dança sequer
sonhou longo...
conheceu loucos, desconheceu a si mesmo
escreveu até secar.
abriu os olhos, é fim de ano novamente
ninguém mais na praia,
exceto um moço montado num cavalo sem cela, lá de longe.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

  Ela ficou no carro estacionado por quase uma hora. Chorou, gemeu, pediu a Deus que a fizesse sumir, quem sabe um terrorista, uma bomba, uma estouro e um fim. Bebeu todo o líquido da garrafa de vinho, engoliu o seu remédio, estava com o corpo energizado.
  A loucura lhe agradava. Pediu que lhe levassem à um hospício, lá as pessoas vivem. Os gritos, as risadas, os corpos nus, sofrimento e alegria. Sentimentos devem ser vividos até a última gota da garrafa. Ou então, poderia simplesmente dopar-se para o mundo, apertar o foda-se. Tudo que ela queria era escapar às conveniências, às organizações que movem todos os corpos, como se existisse um só movimento.
  Um hospício, lá ela seria. Lá a existência mostraria sua cara, seus seios fartos, suas caspas nos cabelos. Estava cansada... Cansada desse mundo limpo, de coisas no lugar. Queria o não lugar das coisas, o trânsito (o trase).
  De dentro do carro observou... estava dentro, estava fora, agora estava fora de si. Estava neles. Aquelas senhoras lustradas, com seus cabelos de velhas traídas, aquelas senhoras segurando bandejas de doces. Deveriam estar indo para algum aniversário de família, ela pensou. Era domingo a noite, deveriam estar indo em direção à alguma tela, uma televisão do Faustão. Maldito Faustão, queria você no hospício comigo pra trocar uma idéia crua. Ela riu, deu gargalhadas, mexeu o corpo todo. Mas que patético o nosso viver... Vão se empanturrar de doces hoje, amanhã vão passar fome pra dimunuir um pouco de tanta gordura... Ah esses domingos brasileiros! Quando Faustão morrer, claro que ele só sai de dentro da tela quando morrer, o brasileiro vai precisar se readaptar, vão ter de aprender a olhar fora da tela.
  Aquele carro era confortável, lá fora que não era. Poderia ficar morando alí, até criar animais em torno do seu corpo. Aranhas, baratas, musgos, formigas, seu corpo... todos alimentando-se uns dos outros, um tipo novo de cadeia alimentar, até que seu corpo se transformasse numa coisa outra, numa comunidade de insetos e poeiras.
  Mas aquelas pessoas, quanta mediocridade. Lembrou-se da criança que ri como um macaco de circo, saltitante, a cada vez que recebe aplausos para suas mungangas, antes de voltar para sua jaula.
  Pelo retrovisor ela o avistou.... Pés descalços, pele encardida, coberto por uma roupa que mais parecia uma mortalha. Ou não seria aquele um uniforme de manicômio? Barba e cabelos longos, carregava uma grande sacola de estopa na cabeça.
  Sumiram de seu pensar as bandejas de doce, as velhas, o Faustão enquadrado na Tv e as risadas frenéticas.
  Alí estava o Sr. Equilíbrio. Um pé depois do outro, um homem em si, o momento tranquilo, a serenidade. O mundo não lhe pesava, carregaria qualquer coisa naquela sacola, pois seus pés eram firmes, tocavam inteiros no chão, um ser, naquele domingo tão brasileiro.
1.
Permanência fez casa nele, trouxe cama, roupa e cachorro. Permanência entrou no seu corpo, deu sopro de tempo longo e o fez dormir. Permanência trancou a porta e o deixou tranquilo. Ele já não sabia bem o que queria, estava abrandado, um tipo anestesiado. Daquele jeito, o espírito não inquieta, assim é bom. Passaram-se um, dois, três dias (ou foram anos?)...
2.
Veio vento de desfazer feitiço e desfez aquele nó que coloca o corpo pra permanecer. O corpo novo, agitado, enlouquecido de vento, levantou-se de seu colchão mais confortável. O corpo estava mole, torto, uma ressaca de eternidades celeste. Imagine só, mas que corpo desacostumado! Ou não, imagine só mas que corpo acostumado! Ossos gelatinados, hálito de lavanda, cabelos úmidos, passos cambaleantes. Cada passo de corpo frágil, bocejos descontrolados. Eis que o corpo se espreguiça.
3.
Permanência pediu que ele voltasse, disse que o mundo não tem casa nem cachorro. Disse que existem ventos de cor que o cegariam, que as pessoas o trairiam, que é um mundo de incertezas.
4.
Lá vai o homem torto, feito uma girafa que acaba de nascer, e ainda não segura seu longo pescoço que tudo vê.
Lá vai o cachorro no mundo novo, lá vai o farejador de rabo abanando e orelhas atentas...
Esse é o quarto das coisas 
inacabadas
Dos ciclos não fechados
Da espera que desistiu
.
O acontecer que não alcança a expressão.
.
Esse é o âmbito do abandono
Da terra espalhada
É o desfazer de pegadas
.
Eis o caminho contrário
As frases descompletas
Leituras fragmentadas
Um adormecer durante a escrita
.
Coisas por fazer...
.
Esse é o quarto causado pelo fluxo descontente,
Esse é o fim que não tem